segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Esquizofrenia e Transtorno bipolar _ Lab. de Neurociências


O continuum das psicoses: esquizofrenia e transtorno bipolar em xeque

As psicoses, estados caracterizados por alucinações, alterações no comportamento e na apreensão de aspectos da realidade, são tradicionalmente divididas de acordo com sua origem em orgânicas (p. ex., alterações cerebrais por abuso de drogas ou doenças clínicas levando à psicose) ou funcionais (ou não-orgânicas, na medida em que não conhecemos os mecanismos biológicos que as produzem). Há mais de 100 anos, o psiquiatra alemão Emil Kraepelin (1856-1926) classificou as psicoses endógenas em dois grupos distintos: (1) doença maníaco-depressiva (atual transtorno de humor bipolar), com períodos de estado psicótico, porém com recuperação plena entre os episódios; ou (2)demência precoce (o termo esquizofrenia só apareceu mais tarde, com Bleuler), grupo envolvendo diversas síndromes caracterizadas por comprometimento clínico mais grave e ausência de remissão completa dos sintomas após a primeira crise. Entretanto, recentemente pesquisadores suecos investigaram 2 milhões de famílias (9 milhões de indivíduos) quanto ao risco de esquizofrenia (36 mil afetados) e transtornos bipolar (40 mil afetados). Trata-se do maior estudo familiar envolvendo esquizofrenia e transtorno bipolar já realizado. Resultados: (1) indistintamente, esquizofrenia e transtorno bipolar foram encontrados em iguais proporções em familiares de indivíduos afetados e (2) as herdabilidades estimadas para esquizofrenia (64%) e transtorno bipolar (59%) mostraram-se igualmente elevadas. Tais achados demonstram que, pelo menos parcialmente, esquizofrenia e transtorno bipolar compartilham de causas genéticas comuns, o que põe em xeque a tradicional dicotomia na classificação das psicoses endógenas vigente até os dias de hoje. Nas últimas décadas, inúmeras evidências convergem para a idéia de que as psicoses endógenas constituam um modelo unitário em que participam diversos genes com efeitos parciais que, quando somados, superam um limiar além do qual temos então a manifestação clínica da psicose. Embora em menor escala, o estudo também demonstrou que os efeitos ambientais também se fazem sentir, seja em esquizofrenia (4,5%) ou no transtorno bipolar (3,4%).
Comentário feito por: Paulo C Sallet, Ph.D.
Fonte: Lichtenstein P, Yip BH, Björk C, Pawitan Y, Cannon TD, Sullivan PF, Hultman CM. Common genetic determinants of schizophrenia and bipolar disorder in Swedish families: a population-based study. Lancet. 2009 Jan 17;373(9659):234-9.